Durante toda a noite, Sashi não tinha dito absolutamente nada. Rani suspeitou que algo se passava. Os pais de Sashi provavelmente pensavam que era por causa do castigo mas Rani percebeu que era mais que isso. E Nihar também. Apesar de ser novo, Nihar não era burro. Percebia perfeitamente quando a sua irmã estava perturbada por alguma coisa. Mas não podia perguntar em frente aos pais. Teria que apanhar Sashi mais isolada, para que ninguém ouvisse. Quando os pais se deitassem seria a melhor oportunidade para isso.
Enquanto Nihar esperava pela sua oportunidade para falar com a irmã mais velha, Rani deicidiu que iria esperar que a neta lhe perguntasse alguma coisa. Ela recorria sempre á avó para conselhos sobre a vida, enquanto que ao pai era mais sobre a natureza, morais e valores e á mãe recorria em tempos de dúvidas amorosas. Mas para conselhos sobre a vida, era com Rani que Sashi falava. Esperou a noite toda, e Sashi nada disse.
- Bem vamos dormir. Sashi, apaga a fogueira por favor. – pediu Mehul enquanto se dirigia para a tenda com Jayce e Rani. – Não fiquem a pé durante muito mais tempo, amanhã temos muito para fazer.
- Sim pai. – responderam os irmãos, simultanemanente.
Esta era a oportunidade que Nihar estava á espera. Aproximou-se de Sashi com um cesto com alguma terra para apagarem a fogueira.
- Que se passa Sashi? – perguntou.
- Nada porquê?
- Estás extremamente calada. Não me mintas, já sei como és e isto não é por causa do castigo que os pais te deram.
- Nihar, não quero falar no assunto. – respondeu Sashi.
- Sou teu irmão. Se estás a planear alguma coisa tenho direito de saber. Já não sou nenhuma criança Sashi. – Sashi suspirou. Ele tinha razão e eventualmente todos saberiam o que se tinha passado.
- Vou fugir Nihar. – disse.
- O quê? Mas porquê? Sashi se é por causa do castigo…só falta uma semana!
- Não é por causa do castigo. Faço isto para vos proteger. – respondeu.
- Não compreendo…
Sashi voltou-se para o irmão mais novo que a olhava preocupado. A fogueira já estava apagada e estavam agora em total escuridão, apenas o luar dava alguma visibilidade para poderem ver as silhuetas de cada um.
- Se eu não casar com o Karuk, todos nós seremos expulsos da aldeia por desrespeito ao chefe.
- Então casa-te com o Karuk.
- Nihar, eu não o amo. Ele é querido e simpático mas não seria feliz. Portanto entre uma coisa ou outra, prefiro sair da aldeia e vocês permanecerem aqui, como é suposto.
- Mas…eu fico sozinho. – respondeu Nihar, olhando lentamente para o chão.
- Tens os teus amigos. Tens os pais e a avó, não vais estar sozinho.
- Mas quem é que vou chatear? És minha irmã, preciso de ti.
- Eu não sei para onde vou ainda. Mas tem que ser um sitio longe o suficiente daqui para que ninguém me descubra. Não te posso prometer nada, mas quando estiver num sitio seguro, eu volto aqui, numa noite depois do jantar para te dizer. E podes visitar-me sempre que precisares.
- Mesmo?
- Mesmo.
Ambos sorriram e Nihar abraçou a irmã com força. Sashi retribuiu. Depois Sashi lentamente terminou o abraço e olhou para o irmão. Ia ter saudades dele, mas em breve iria visitá-lo. Aquela era a melhor decisão a tomar. Não era capaz de se casar mas era ainda menos capaz de ser egoísta ao ponto de desterrar a familia inteira. Faria o sarificio de se exilar sozinha.
- Toma. – disse Nihar, estendendo a mão à irmã.
- Que é isso? – perguntou Sashi, pegando no que estava na mão do irmão. Era o seu colar da garra de um urso. – Nihar não posso aceitar isto. É o teu favorito.
- Precisas de protecção mais do que eu mana. –disse, sorrindo.
Abraçaram-se uma ultima vez e antes que os pais desconfiassem da demora, e antes que Nihar lhe mudasse as ideias, Sashi correu para a floresta o mais rápido e silenciosamente que conseguiu. Ela conhecia um sitio perfeito para ficar, era um lugar sossegado, onde havia fácil acesso a comida, nomeadamente fruta, e suficientemente longe da aldeia para que ninguém a encontrasse durante uns tempos. A sua nova casa era um tronco de sequóia gigante que, a uns cinco metros do chão, tinha no tronco um buraco que era oco por dentro. Era o sitio perfeito para Sashi se abrigar do frio e do calor. Longe o suficiente do chão, evitando assim animais predadores e dos insectos mais incomodativos, como as formigas e as vespas.
Assim que chegou lá, foi em busca de algumas folhas para forrar o chão da gruta natural. Protegia da humidade natural da árvore e ficava mais confortável. Tinha trazido de casa uma manta de pele de urso, pois o Inverno estava perto e tinha trazido também uma faca pequena e uma ponta de lança para facilitar as caçadas. De certo que não iam dar falta dos materiais até descobrirem que ela tinha fugido.
Depois de forrar o chão da árvore, Sashi sentou-se olhando para o exterior. Hoje era o inicio de uma nova vida. Só esperava estar a fazer a decisão certa.
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